O que é a Nova Indústria Brasil (NIB)

O debate sobre a Nova Indústria Brasil (NIB) continua aquecido. Como falamos anteriormente, fazia falta a elaboração de um plano que traçasse linhas de orientação para a construção de uma política de neoindustrialização no país. O Brasil já havia alcançado uma posição destacada no campo da produção industrial, mas, de alguns anos para cá, fomos recuando diante da incompetência e subserviência da burguesia nacional e de sucessivos governos. Passamos a nos afirmar apenas como fornecedor de produtos agrícolas e minerais, as chamadas commodities. Tornamo-nos um dos maiores exportadores mundiais de várias delas. Avançamos em outra posição de destaque também no campo do petróleo e derivados, o que foi reconhecido pelo convite para integrar a OPEP plus. Fazia falta assumir, então, uma posição no campo da produção industrial. Com o avanço do capitalismo no campo e o uso das novas tecnologias na agricultura, ganhamos o destaque atual no agronegócio. Há que lamentar a destruição causada nos diferentes biomas, onde a ganância se sobrepôs à racionalidade, e práticas predatórias foram disseminadas, provocando danos de difícil reparação. Todos estes fenômenos transcorreram sem despertar grandes celeumas ou controvérsias. Agora, com a NIB, a casa de marimbondos foi assanhada. E o que vem provocando tal confusão?

Com a NIB, uma velha discussão, há muito superada, voltou: a discussão sobre o papel do Estado na economia. Falamos disso, em análises anteriores. A discussão divide os economistas em duas correntes: os chamados ortodoxos (liberais, neoclássicos), que defendem a não intervenção do Estado na economia, e a outra corrente, os heterodoxos (keynesianos, desenvolvimentistas, marxistas), que consideram que o Estado deve ter uma função de orientação e coordenação na promoção do crescimento. A predominância dos heterodoxos no governo atual levou à publicação do documento.

Há outras duas questões antigas ligadas a esta que precisam igualmente ser lembradas: o papel do planejamento como promotor do desenvolvimento e o papel da industrialização neste processo. A questão do planejamento vem desde a reconstrução das economias dos países socialistas, da URSS. Enquanto o mundo ocidental entrava em convulsões periódicas, com as crises de superprodução (crises cíclicas), o bloco dos países socialistas mantinha um crescimento contínuo, apesar de toda a sabotagem e bloqueios ocidentais. Os teóricos arrancavam os cabelos na tentativa de explicar o fenômeno. Há uma abundante literatura sobre o assunto, problema que poderemos tratar em futuras análises.

A outra questão é o papel da industrialização na superação do subdesenvolvimento. Esta questão foi centro da discussão no âmbito da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), órgão da ONU sediado no Chile, onde funcionou a Escolatina, uma escola de economia que produziu grandes pensadores. Predominou neste debate a posição de que, para superar o atraso em que se encontravam os países da América Latina, seria necessária uma política de industrialização. Foram os teóricos desta corrente os responsáveis pelo grande sucesso do governo Juscelino Kubitschek, com seu “Plano de Metas”.

Todas estas questões estão por trás do debate atual. Os reacionários não conseguem ter novas ideias. Aferram-se aos velhos tabus, mesmo em condições tão diferentes, e quando suas ideias já estão, comprovadamente, superadas em todo o mundo.

Mas, voltemos ao NIB, assunto que nos interessa agora.

Para a realização da NIB, estão destinados recursos da ordem de R$300 bilhões a serem gastos em 4 anos. Aí começou o berreiro. Os guardiões do equilíbrio fiscal passaram a criticar a gastança, que terá consequências no aumento do déficit do orçamento. Não se deram conta que no documento não está previsto nenhum tostão do tesouro. Os recursos virão do FNDCT, do FUST, do FAT e de captação internacional. É de notar ainda que, quando o governo reservou R$364 bilhões para ser gasto, em um ano, no Plano Safra, não houve qualquer protesto. Os críticos nem sequer se dão ao trabalho de olhar para o que ocorre no mundo capitalista desenvolvido, neste momento de reestruturação da globalização. As políticas industriais estão dominando o mundo. Para se ter uma ideia, em muitos países desenvolvidos estão sendo praticadas políticas de industrialização e, para isto, são destinados imensos recursos. Somando-se EUA, União Europeia, Reino Unido e Japão, por exemplo, o montante atinge US$6,8 trilhões. E é preciso considerar as desvantagens que temos por cá, e que nos obrigam a um esforço redobrado, como o “custo Brasil”, que atinge R$1,7 trilhões. Além disso, temos dificuldades de financiamento. Basta lembrar que os spreads bancários aqui são de 27,4%, enquanto a média mundial é de 7,3%.

O NIB, que ainda necessita de regulamentações e muitos detalhamentos, destacou 4 temas para a ação do governo: inovação, produtividade, descarbonização e exportação, tendo como elemento central a indústria. Pretende-se estimular o combate aos gases de efeito estufa, a produção de biocombustíveis, a criação de uma matriz energética mais limpa, ações em que já temos experiência.

As propostas visam a nos posicionar melhor nesta nova etapa da globalização, uma vez que já se compreendeu que não há como fugir da integração neste processo. O acirramento das tensões internacionais ameaça interromper os circuitos comerciais que passam pelo mar vermelho. O fluxo das embarcações tem se deslocado para o sul da África, contornando o Cabo da Boa Esperança, o que encarece os fretes e aumenta a duração da viagem cerca de 10 dias. Com o crescimento das possibilidades de generalização da guerra na região da Palestina, diante dos massacres praticados por Israel em Gaza, tornaram-se cada vez mais usados os termos como friend-shoring, nearshoring. Isto é um indicador do deslocamento das relações comerciais, do ocidente para países mais próximos, e o enfraquecimento das ligações com os países asiáticos, o que é ainda mais agravado pelas tensões com a China.

Torna-se necessário aproveitar o momento para retomar nossa industrialização, visando um melhor posicionamento na nova globalização que está em marcha, e turbinar o crescimento do país.