Vamos imitar os Estados Unidos?

A partir dos anos 50, no âmbito da CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina), órgão da ONU, foram desenvolvidas teorias na tentativa de explicar o subdesenvolvimento da região. Estas teorias formaram o que se chamou “pensamento cepalino”. Brilhantes economistas participaram deste processo entre os quais alguns brasileiros como Celso Furtado, Maria da Conceição Tavares, Carlos Lessa etc. Segundo estas teorias entre as causas do fenômeno do subdesenvolvimento estava a inexistência do setor industrial. Para superar o atraso seria então necessário iniciar um processo de industrialização das economias da região. O Brasil entrou na corrida e o governo de Juscelino Kubitschek empenhou-se nesta dura tarefa com o seu “Plano de metas” que foi realizado com grande sucesso. Foi o processo que ficou conhecido como “processo de substituição de importações”. No final do seu governo JK entregou um país com um complexo parque industrial onde existiam empresas de quase todos os setores embora com grandes deformações.

Depois do golpe militar este processo de industrialização foi perdendo o ritmo e o país foi retornando ao seu antigo papel de exportador de matérias primas posição que hoje se consolida mudando de nome: somos fornecedores de “commodities” e nos orgulhamos de ser “o celeiro do mundo”, embora o povo passe fome. A partir dos anos 80 esta posição se consolidou agora fortalecida com a exploração do petróleo. Passamos a ser um dos maiores fornecedores mundiais desta commoditie o que nos levou a sofrer com a “doença holandesa”. O processo de desindustrialização se acelerou e teve como maior consequência a perda da indústria de máquinas e equipamentos, os chamados meios de produção que constituem o “Setor I” da economia. É este o setor industrial responsável pela retomada do crescimento e pelo início da fase de reanimação.

Quando a fase de crise é ultrapassada, as empresas, diante do aumento da demanda, e não tendo mais condições para ampliar a produção por ter utilizado toda sua capacidade ociosa, tomam as decisões de fazer novos investimentos que se materializam na compra de equipamentos e máquinas. Esta demanda por equipamentos põe em movimento o Setor I que começa a contratar novos trabalhadores. Os novos salários pagos aumentam a demanda por meios de consumo, o que se reflete sobre o setor de bens de consumo (Setor II) que passa a ser também estimulado. A mesma dinâmica anterior vai se repetir. Quando sua capacidade ociosa for reduzida este setor também vai iniciar sua fase de investimentos com a encomenda de máquinas. Cria-se o ciclo virtuoso de expansão. Aí está a razão da retomada da economia e da entrada na fase de reanimação do ciclo.

Como não temos mais o setor produtor de meios de produção (Setor I) toda esta demanda por máquinas transfere-se para o exterior. O estímulo que deveria ser interno é deslocado para fora e vai beneficiar as economias de outros países.

Aí está a razão para que a nossa economia tenha atualmente retomadas lentas e não mais atinja as taxas elevadas que conseguimos no passado. Passamos a depender da importação de máquinas e equipamento principalmente da China, Rússia, EUA e Alemanha, países que se beneficiam dos impulsos da nossa recuperação.

A única maneira de alterarmos este movimento é adotando uma política industrial correta hoje chamada de neoindustrialização, que possa beneficiar os setores que mais são necessários e são responsáveis pelo dinamismo da economia. Claro que estes setores são os de mais alta tecnologia. Daí a necessidade de investimentos também nos programas de formação científica e pesquisa que permitam a retenção dos cérebros que são aqui formados e atualmente são obrigados a emigrar para o exterior em busca de melhores condições de trabalho.

Um bom exemplo dos efeitos de política deste tipo pode ser encontrado na chamada “bidenomics” agora adotada pelo governo Biden nos EUA. Depois de assistir durante anos a migração de suas empresas para o exterior, principalmente para a Asia (países como China, Vietnam, Malásia etc.), por razões de geoestratégia, no momento atual, o governo americano está estimulando o retorno de empresas que se deslocaram ao exterior em busca de melhores condições para a produção, principalmente mão de obra barata. Estão sendo feitos pesados investimentos em infraestrutura, na economia verde e na produção de semicondutores. Os gastos ultrapassam mais de US$ 1 trilhão. Como resultado os analistas esperam que, na fase de crise mundial que estamos enfrentando, a economia americana sofra uma desaceleração lenta que está sendo chamada de “pouso suave”. Graças aos subsídios que estão sendo oferecidos, a construção de fábricas dobrou no último ano aumentando o emprego e, consequentemente, o consumo.

Como contrapartida é sentido um aumento da inflação, que o Federal Reserve (Fed), Banco Central americano tenta frear, e um aumento do déficit fiscal que somou US$1,4 trilhão, o triplo do mesmo período do ano anterior. O déficit fiscal que aterroriza as autoridades monetárias por cá, ao que parece, não causa preocupação às autoridades de lá.

Será que a máxima de “o que é bom para os EUA é bom para o Brasil”, tão badalada pela direita, deixou de funcionar?