A “Nova Indústria Brasil”: uma política industrial

Finalmente, temos um plano para o desenvolvimento da indústria. Foi publicado o documento intitulado a Nova Indústria Brasil (NIB). A política industrial, que estava fazendo falta ao país, está finalmente esboçada. Temos sofrido com o fenômeno da desindustrialização, já há algumas décadas, sem que nenhuma medida tenha sido tomada. A incompetência e debilidade de nossa burguesia dificilmente torná-la-ia protagonista desta iniciativa. Seu comprometimento com o sistema financeiro, com o agronegócio e com o capital internacional a torna caudatária destes outros segmentos. Só o Estado teria a capacidade de lançar tal projeto. Infelizmente, depois da deposição da Presidente Dilma, passamos por um tenebroso período de incompetência e desgovernos que paralisou o país. Com a eleição do novo governo, esta iniciativa tornou-se possível. Esperamos, agora, que os setores empresariais deem sua colaboração. Por enquanto, apenas a CNI, timidamente, declarou apoio. A poderosa Fiesp mostra-se reticente. Consultorias e economistas, ligados ao setor financeiro e a conhecidos centros de pesquisa e universidades, já vieram a campo para desferir ataques ideológicos ao projeto.

Alguns órgãos da imprensa entraram no combate. O problema é que o programa mexe com uma velha questão teórica que divide os economistas em duas grandes correntes. É um debate antigo sobre o papel do estado na economia. Os chamados ortodoxos (liberais, neoclássicos) defendem a não intervenção do estado nas questões econômicas, pois, segundo eles, as forças do mercado, espontaneamente, orientam os agentes econômicos, levando ao equilíbrio ótimo na utilização dos fatores de produção. A outra corrente, os heterodoxos (keynesianos, desenvolvimentistas, marxistas), consideram que o Estado deve ter uma função de orientação e coordenação na utilização dos fatores econômicos e que, o mercado, por si só, não consegue conduzir um processo de desenvolvimento com o mínimo de eficiência. No governo atual, predominam os economistas heterodoxos que, finalmente, saíram a campo para levar à prática suas teorias. Desta vez, no entanto, estão recebendo um grande suporte da situação internacional e das políticas econômicas, que estão sendo praticadas em muitos países desenvolvidos.

Com efeito, temos destacado em análises anteriores, que a atual situação econômica do mundo atravessa um momento muito delicado. Fenômenos de ordem não econômica têm interferido nas relações entre os países e contribuído para desorganizar o processo de acumulação do capital em escala mundial. Deixando de lado o aquecimento global, com as catástrofes que vem provocando, já mencionamos a pandemia do Covid-19 como um dos fatores de grande impacto. Ainda não bem superado este impacto, outro acontecimento, igualmente não econômico, abalou o panorama europeu: a guerra Rússia Ucrânia. Estes dois fenômenos atingiram em cheio o processo de recuperação da economia mundial, que vinha saindo de mais uma crise cíclica. Houve uma ruptura geral dos processos produtivos, das cadeias de valor, das comunicações, do comércio mundial, das rotas de navegação, do fornecimento de matérias primas e insumos os mais diversos. O processo de globalização, que vinha atravessando uma fase de reestruturação, sofreu um grande abalo. Agora, como se não fosse já suficiente, a nova guerra Israel Gaza voltou a levar as relações internacionais a um ponto ainda mais elevado de tensão.

O envolvimento dos EUA e da União Europeia no massacre brutal, que ocorre em Gaza e no resto da Palestina, tem levado à revolta e reação de várias organizações árabes fazendo surgir o perigo de generalização da guerra em toda a área. A navegação pelo mar vermelho já começa a ser atingida pelos ataques efetuados pelos Houtis do Iêmen, que como retaliação, passou a ser bombardeado por ingleses e americanos. O sul do Líbano já está em estado de guerra e os ataques chegaram à Jordânia. Surge a ameaça de fechamento total da área, com o bloqueio do Canal de Suez, e o consequente deslocamento da navegação para o contorno do sul da África, o que acarretará o aumento dos fretes e do tempo de viagem dos navios o que, em parte, já está ocorrendo. Se o processo de globalização vinha sofrendo uma reestruturação, agora o problema agravou-se ainda mais.

Como resposta a esta situação, os principais países desenvolvidos passaram a realizar projetos de planificação da economia. É neste contexto que estão em execução as políticas de nearshoring, friendshoring, além do controle de importações e exportações, com objetivos estratégicos definidos pelos governos. Políticas econômicas visam induzir os investimentos em certos setores e internalizar alguns processos de produção considerados estratégicos. Nos EUA, por exemplo, o governo está investindo US$ 2 trilhões e na União Europeia € 2 trilhões para estimular empresários a dirigir seus investimentos para setores considerados importantes para o país.

O exemplo dos países capitalistas desenvolvidos parece ter estimulado a equipe econômica do governo a lançar suas propostas. Contaram para isto com a participação de influente professora da University College London, e autora de vários livros sobre o assunto, Mariana Mazzucato. Participaram da elaboração do documento o Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI) integrado por 20 ministros e o presidente do BNDES.

Esperamos que as orientações trazidas por este documento possam produzir as urgentes medidas que tragam soluções, para a nossa industrialização. Precisamos nos colocar em posição mais vantajosa dentro deste processo de grande ebulição na conjuntura mundial. A oportunidade não pode ser perdida.